Quiabo, Presunto fresco, Tilápia frito
O título lembra receita, não é? Mas engano seu... o assunto aqui relatado não tem nada a ver com culinária! Quiabo? Só pra você ter uma idéia, faz tanto tempo que não como que nem me lembro mais o gosto. Acho que a minha avó era viva quando comi pela última vez. Presunto? Bah!1 o gosto é bom, mas se você ver fabricar não come. E o tilápia frito? acompanhado de uma polenta, uma salada de rúcula2 e um pouco de cuidado, eu até como. Mas vamos ao caso, antes que eu me perca na história.
Eu estava lá misturado em meio aquelas mulheres, observando, nunca fui fã de velório, mas de uma coisa tinha certeza, jamais tinha ido a um com tantas viúvas bonitas. A verdade é que eu nem estava pensando nisso, eu só pensava de onde foi que o Quiabo arrumou tanta mulher pra chorar em seu velório?
Quiabo morrera há pouco, o presunto ainda estava fresco, a viúva chorava, soluçava e resmungava, às vezes gritava, entrando em desespero, mas logo, um consolava daqui, outro dali, um abraço, dois, três, e.... Alguém mais a frente falava alguma coisa, tão baixo que eu nem podia escutar, e aquilo me irritava. Quiabo, deitado, imóvel, com as mãos sobre o peito, vestido em um terno preto, mas que palhaçada! Pensei eu. Quiabo nunca havia usado um terno preto, pra que vestir o infeliz assim? Concluí meu pensamento. Afinal era seu último dia neste mundo, logo seria engavetado. E a viúva? Shirley era seu nome, linda, toda de preto também, soluçava ainda, mas que barbaridade tchê!3.
– Poxa! Alguém por favor pede pra'quele homem parar de falar, ninguém está prestando a atenção nele! Pensei alto naquele momento e alguém resmungou em meu ouvido que o homem estava rezando.
– É mesmo? Rezando? Desculpa! Não sabia! Respondi, em tom baixo, meio acanhado.
Me afastei mais para traz, tentando um ângulo melhor para observar a viúva. Encontrei um noventa graus bem no encontro das paredes, fiquei ali, escorado naquela quina, lugar perfeito.
– Mas e essas mulheres todas? Amantes dele? Perguntava eu a mim mesmo, tentando encontrar respostas ao enigma. Havia entendido então o motivo pelo qual a viúva chora tanto!
– Quem será que colocou esse apelido horrível no vivente?
– Como era mesmo o nome do Quiabo? Acho que ninguém sabe, nem a própria mulher dele! Risos discretos!
Quiabo, trinta e poucos anos, estatura mediana, cabelos e olhos castanhos, nada de especial fisicamente.
– Dinheiro? Você ainda pergunta?! Ora! Bem capaz!4 Todo o mundo sabia que o miserável não tinha onde cair morto. Nem um pinto pra dar agua! Como se diz por aí.
– O que importa é que tinha um coração puro. Alguém atrás de mim resmungou, com voz rouca em meu ouvido.
– Morreu de quê? Perguntei quebrando o pescoço para o lado, mantendo os olhos na viúva e tentando ser discreto.
– Você não ficou sabendo? A voz respondeu perguntando.
– Não! Disse eu rapidamente com um tom de curiosidade.
– Espinha! Veio a resposta.
Eu conhecia o Quiabo o suficiente pra saber que ele não tinha problema de coluna, aliás nunca vi ninguém morrer disso! pensei eu.
– Meu Deus! Tilápia frito! Capaz! Como pode alguém morrer engasgado? Justo o Quiabo! Adorava peixe, comia pelo menos duas vezes por semana.
– Bom a conversa está boa, mas vou indo! Já está na minha hora. Passar bem! E fui em direção a viúva.
– Meus Pêsames! Dona Shirley. Cumprimentei-a olhando bem nos seus olhos e no degote, foi inevitável, tentei disfarçar mas ela percebeu.
Quiabo, Quiabo! Eu pensava. E me afastei dela, engatando uma ré lentamente. Os meus olhos bem fixos nos dela. E ela? nem piscava.
Quiabo, Quiabo! Eu pensava. Coitado!, espinha!, engasgado!, engavetado!, degote!, soluçava!, olho no olho!, piscada!, sorriso no canto da boca! Viúva! Quiabo!
Fui embora, mas fiquei com uma sensação estranha. Quem estava atrás de mim conversando comigo? Se eu estava escorado naquele noventa graus? Bem no encontro das duas paredes da sala? Quiabo?!!! Não tem outra explicação!
O título lembra receita, não é? Mas engano seu... o assunto aqui relatado não tem nada a ver com culinária! Quiabo? Só pra você ter uma idéia, faz tanto tempo que não como que nem me lembro mais o gosto. Acho que a minha avó era viva quando comi pela última vez. Presunto? Bah!1 o gosto é bom, mas se você ver fabricar não come. E o tilápia frito? acompanhado de uma polenta, uma salada de rúcula2 e um pouco de cuidado, eu até como. Mas vamos ao caso, antes que eu me perca na história.
Eu estava lá misturado em meio aquelas mulheres, observando, nunca fui fã de velório, mas de uma coisa tinha certeza, jamais tinha ido a um com tantas viúvas bonitas. A verdade é que eu nem estava pensando nisso, eu só pensava de onde foi que o Quiabo arrumou tanta mulher pra chorar em seu velório?
Quiabo morrera há pouco, o presunto ainda estava fresco, a viúva chorava, soluçava e resmungava, às vezes gritava, entrando em desespero, mas logo, um consolava daqui, outro dali, um abraço, dois, três, e.... Alguém mais a frente falava alguma coisa, tão baixo que eu nem podia escutar, e aquilo me irritava. Quiabo, deitado, imóvel, com as mãos sobre o peito, vestido em um terno preto, mas que palhaçada! Pensei eu. Quiabo nunca havia usado um terno preto, pra que vestir o infeliz assim? Concluí meu pensamento. Afinal era seu último dia neste mundo, logo seria engavetado. E a viúva? Shirley era seu nome, linda, toda de preto também, soluçava ainda, mas que barbaridade tchê!3.
– Poxa! Alguém por favor pede pra'quele homem parar de falar, ninguém está prestando a atenção nele! Pensei alto naquele momento e alguém resmungou em meu ouvido que o homem estava rezando.
– É mesmo? Rezando? Desculpa! Não sabia! Respondi, em tom baixo, meio acanhado.
Me afastei mais para traz, tentando um ângulo melhor para observar a viúva. Encontrei um noventa graus bem no encontro das paredes, fiquei ali, escorado naquela quina, lugar perfeito.
– Mas e essas mulheres todas? Amantes dele? Perguntava eu a mim mesmo, tentando encontrar respostas ao enigma. Havia entendido então o motivo pelo qual a viúva chora tanto!
– Quem será que colocou esse apelido horrível no vivente?
– Como era mesmo o nome do Quiabo? Acho que ninguém sabe, nem a própria mulher dele! Risos discretos!
Quiabo, trinta e poucos anos, estatura mediana, cabelos e olhos castanhos, nada de especial fisicamente.
– Dinheiro? Você ainda pergunta?! Ora! Bem capaz!4 Todo o mundo sabia que o miserável não tinha onde cair morto. Nem um pinto pra dar agua! Como se diz por aí.
– O que importa é que tinha um coração puro. Alguém atrás de mim resmungou, com voz rouca em meu ouvido.
– Morreu de quê? Perguntei quebrando o pescoço para o lado, mantendo os olhos na viúva e tentando ser discreto.
– Você não ficou sabendo? A voz respondeu perguntando.
– Não! Disse eu rapidamente com um tom de curiosidade.
– Espinha! Veio a resposta.
Eu conhecia o Quiabo o suficiente pra saber que ele não tinha problema de coluna, aliás nunca vi ninguém morrer disso! pensei eu.
– Meu Deus! Tilápia frito! Capaz! Como pode alguém morrer engasgado? Justo o Quiabo! Adorava peixe, comia pelo menos duas vezes por semana.
– Bom a conversa está boa, mas vou indo! Já está na minha hora. Passar bem! E fui em direção a viúva.
– Meus Pêsames! Dona Shirley. Cumprimentei-a olhando bem nos seus olhos e no degote, foi inevitável, tentei disfarçar mas ela percebeu.
Quiabo, Quiabo! Eu pensava. E me afastei dela, engatando uma ré lentamente. Os meus olhos bem fixos nos dela. E ela? nem piscava.
Quiabo, Quiabo! Eu pensava. Coitado!, espinha!, engasgado!, engavetado!, degote!, soluçava!, olho no olho!, piscada!, sorriso no canto da boca! Viúva! Quiabo!
Fui embora, mas fiquei com uma sensação estranha. Quem estava atrás de mim conversando comigo? Se eu estava escorado naquele noventa graus? Bem no encontro das duas paredes da sala? Quiabo?!!! Não tem outra explicação!
1 Expressão gaúcha. Eu diria que se trata de uma abreviação da expressão “barbaridade tchê!” Que pode significar um momento de surpresa ou de espanto.
2 Tilápia frito, polenta e rúcula, combinação típica da culinária de imigrantes italianos da região do Rio Grande do Sul, popularmente chamados de Gringos pelas outras etnias desta mesma região.
3 Expressão gaúcha. Que pode significar um momento de surpresa ou de espanto.
4 Expressão gaúcha. Pode expressar um momento de dúvida sobre determinado assunto.
Kleber J. G. Martins - 03/08/2010
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